Chegamos em Paris, eu e minha mulher, na manhã de 11 de fevereiro de 2010, uma quinta-feira, às 10 horas aproximadamente, num avião que havia decolado de Guarulhos, em São Paulo, no início da noite do dia anterior. Vínhamos de Curitiba, eu como bolsista do governo brasileiro, para um estágio de doutorado de um ano.
Nevava quelques flocons – expressão francesa muito usada quando a meteorologia indicava neve fraca. Lentamente, desembarcamos do avião, muito agasalhados, diretamente na pista do aeroporto Charles de Gaulle. Em poucos minutos um ônibus nos deixou no prédio do aeroporto e, depois da verificação dos passaportes e reunião das seis malas em dois carrinhos, conseguimos um taxi – de tamanho suficiente – e iniciamos nosso deslocamento até o Boulevard Jourdan, 17, endereço da Cité Internationale Universitaire de Paris, onde residiríamos na Maison du Brésil.
No silêncio do taxi, voltei a memória à minha infância. Quando criança, aos domingos pela manhã, meu pai, na falta de seu próprio automóvel, nos levava – eu e meus primeiros irmãos – para passear de taxi. Seguíamos por trajetos e lugares então estranhos, por entre pessoas, casas, edifícios, árvores e tantas outras coisas que víamos em movimento. Naquela manhã parisiense, a cidade que passava veloz pela janela do taxi recordava a mesma cidade misteriosa da minha infância.
Conhecia a Cidade Universitária e a Casa do Brasil por imagens do Google e “passeios” usando o street view. Com o frio e a neve nada era reconhecível, além disso, havia imaginado o taxi nos deixando na porta da nossa nova morada, mas a entrada de carros na Cité só era possível com autorização. Desembarcamos, nós e as seis malas, na calçada em frente a um dos acessos para, logo depois, começar a descobrir porque o local é chamado de “cidade”.
Figura 1 – Vista da fachada do edifício da Maison du Brésil.
A Cité localiza-se num parque de 34 hectares onde, além dos prédios e espaços administrativos, culturais e esportivos, estão construídos outros 40 edifícios – as Maisons – que abrigam mais de 10.000 estudantes a cada ano, de 140 nacionalidades diferentes. Ao cruzarmos o portão de entrada devíamos seguir por uma rua asfaltada, larga e tortuosa, contornando alguns edifícios entre muitas árvores. De acordo com o mapa, a Maison du Brésil ficava à esquerda, no final daquele caminho. Para chegar lá, precisávamos levar as seis malas. A solução foi puxarmos duas malas cada um por 15 a 20 metros, largá-las e voltar para buscar as outras duas deixadas para trás. Naquele frio, a tarefa cansativa, irritante e tragicômica durou em torno de 150 metros até o destino. Tudo, porém, foi rapidamente esquecido ao, finalmente e depois de três horas do pouso em Paris, entrarmos na Casa do Brasil para o conforto proporcionado pela calefação.
Nosso recepcionista, natural do Rio de Janeiro, identificou-se como Fred, passando a solicitar alguns documentos e nos informando acerca do funcionamento e das facilidades encontradas na Casa do Brasil, no espaço da Cité e no seu entorno. Descobrimos então que habitaríamos o segundo andar, num apartamento de 25m², localizado na extremidade esquerda do edifício – chambre 200. De posse de dois cartões magnéticos que permitiam acesso ao prédio e ao nosso apartamento, subimos para deixar as malas.
Figura 2 – Vista dos fundos do edifício da Maison du Brésil.
Recém-chegados e famintos, resolvemos aceitar a dica do nosso simpático recepcionista e nos dirigimos ao Restaurante da Cidade Universitária para almoçar. Já era tarde e as atividades gastronômicas daquela manhã estavam quase encerradas. Almoçamos basicamente arroz. À tarde, fizemos nossa primeira incursão ao entorno da Cité até um supermercado próximo, pois, precisávamos abastecer armários e geladeira e garantir um jantar mais substancioso. Depois de desfazer as malas e guardar toda a bagagem, fizemos um lanche e demos por encerrados os dias de viagem – para mim um único e longo dia sem dormir.
Ao deitar a cabeça no travesseiro aquela noite, esperei o sono pensando na distância que agora me separava da família e dos amigos. Ainda não sabia que alguns deles nos visitariam durante aquele ano. Mas estas são outras histórias…
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