Aprendemos que a prática política deve ter como objetivo o bem comum. Que numa sociedade democrática isso significa cuidar das condições necessárias para assegurar a cada indivíduo uma vida digna. Das tantas condições indispensáveis, a mobilidade é hoje, seguramente, uma das mais importantes a apelar pela atenção do poder público. No caso brasileiro, impossível não preocupar o descaso e, muitas vezes, os equívocos das iniciativas adotadas. Apesar de ser considerada exemplo de urbanismo, Curitiba acumula, já há algum tempo, problemas nessa área e, em certos casos, é patente a má administração do dinheiro público.
Muitos são os exemplos, mas comecemos por um aspecto paralelo, mas não menos importante: a facilidade de acesso pelos usuários aos ônibus do transporte público coletivo. Na maior parte das linhas que servem a cidade, o acesso aos coletivos se dá por escadas posicionadas nas portas de entrada e saída dos veículos, o que prejudica pessoas idosas, senhoras com carrinhos de bebê e cadeirantes. A partir de 1991, em alguns trajetos, foram adotadas estações tubo. Recentemente, a Prefeitura de Curitiba anunciou a intenção de implantar novas estações, diferentes das atuais (figura 1). A julgar pelas imagens divulgadas pelo IPPUC, seguirão o mesmo conceito adotado pelas antigas estações, isto é, terão a forma de corredor coberto, envidraçado e a ser acessado por rampa.
Figura 1 – Projeto Nova Estação Tubo
Cabe recordar que, de início, algumas estações tubo, além da escada, possuíam uma plataforma para acesso de cadeirantes ou de usuários com necessidades especiais. O elevador foi logo abandonado, pois, a prática demonstrou sua inviabilidade. Foram então substituídos por rampas (figuras 2 e 3). A solução adotada, resolveu um problema, mas causou outro, ou seja, a rampa, para a usabilidade do cadeirante, teria de ter leve inclinação, o que a fez ocupar quase a mesma área da própria estação, obstruindo então a mobilidade dos pedestres. Apesar de esteticamente notáveis, as estações tubo demandam altos custos de construção e manutenção. Em 28 de fevereiro de 2018, em seu blog, Fábio Campana, registra:
O vereador Cristiano Santos, do PV, quis saber quanto custa cada estação tubo. Os valores são impressionantes e segundo a URBS a falta de empresa especializada neste tipo de construção é um dos principais fatores pelos altos custos. O valor médio para instalação de uma estação menor e mais comum, R$ 198 mil; a mais cara e maior, R$ 570 mil. Isso sem contar a implantação do elevador de acesso para pessoas deficientes, carrinhos de bebê etc., mais ou menos, R$ 27 mil.
Figura 2 -Estação Tubo
Figura 3 -Estação Tubo
Porque complicar se é possível facilitar
Durante um ano, morei com minha mulher em Paris. Um longo período sem carro e sem necessidade dele. Com um cartão magnético, renovado mensalmente, usa-se o sistema de trem, metro, tramway (no Brasil VLT) e ônibus. Todo um sistema (verdadeiramente) integrado de transporte público. De comum, todos esses modais de transporte permitem acesso dos usuários sem o uso de escadas ou rampas, inclusive os ônibus. No caso dos ônibus, ao estacionar para o acesso dos passageiros, o sistema de suspenção faz a carroceria ceder e alinhar com a calçada. Outro detalhe importante é que o piso dentro do ônibus dispensa degraus. No caso dos cadeirantes, o próprio ônibus possuí um sistema de rampa para facilitar o acesso (figura 4). Dessa forma, fica assegurado o direito a uma mobilidade independente de instalação de mobiliário urbano ou qualquer outro dispositivo externo.
Figura 4 – Acesso a ônibus metropolitano em Paris
No caso de Curitiba, impossível não questionar os elevados custos das estações tubo. Como visto, podem ser substituídas com vantagens, pois não resolvem o problema de mobilidade e, ainda, demandam dos cofres públicos fatia considerável de recursos para construção e manutenção. Por outro lado, a adoção de coletivos melhor projetados, resolveria o problema de mobilidade dos usuários, independente do trajeto, o que hoje não acontece. A esse respeito, cabe observar que em 2016, a Volvo testou em Curitiba o que, à época, foi batizado de Hibriplug (figura 5). Um veículo híbrido, eletrodiesel, projetado com atenção a mobilidade. Na ocasião, de acordo com reportagem, ônibus semelhantes já circulavam na Suécia, Alemanha e Bélgica. Hoje já circulam em outras cidades brasileiras. E em Curitiba? O que aconteceu? Conflitos entre interesses políticos?
Figura 5 – Veículo Volvo Hibriplug testado em Curitiba em 2016
Por fim, preocupa o fato de o acesso aos coletivos ser apenas um aspecto menor diante do imenso atraso no planejamento necessário para dar conta de soluções para o problema de mobilidade urbana em Curitiba.
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